4 de out. de 2005

Um Lugar de Menina (Goretti Brandão)

Apanho da saudade pequenos objetos;
O caderno das minhas primeiras letras,
Uma chuva que ia e que vinha...
A mecha clara cortada dos meus cabelos,
Uma sala de estar de brinquedo de plástico azulzinho,
Kátia Lilian, minha boneca,
E minhas asas de borboleta do pastoril.
Meu irmão ganhou uma bola colorida,
Que foi cair lá na roseira do jardim,

E voltou toda furada...
Ainda a alegria da rua naquela tarde de festa,
E no açougue, o alarido dos cães sem dono,
A calçada dourada de tanto sol que batia...
Aquele vestido novo para o dia de Natal,
O pega-varetas,
E o meu jogo de damas...

É igual como trazer de volta,
Um mundo inteirinho de conhecidos pormenores,
Onde a largura da rua é tão grande,
Que dá para passar dois carros de boi, com rodas que tocam música.
Tem até os olhos molhados daquele menino, que se perdeu,
E ficou sem ninguém, chorando assustado.
E que parou de chorar; distraído,
Quando um carro de boi passou tocando.
Até eu que tive tanto dó do menino distraí-me também.
E esqueci da pena que sentia dele.
Tem a feira com bonecas de pano e pés- de- moleques.
E o beiju, que trouxeram dela para mim,
E deixaram embrulhado em cima da mesa.
Bem ali adiante, a barraca onde minhas tias-avós,
Vendem modinhas de coco e pinhões de açúcar queimado.

Como encontrar o caminho do tempo que leva àquele lugar?
Em que lugar de mim, esqueci a menina que recortava revistas?
Não sei que fazer das lembranças que ela deixou comigo...

(Poema de uma grande artista ribeirinha, vinda dos lindos confins de Pão de Açúcar)

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