29 de ago. de 2008

Além da Procura por uma Pétala de Prazer (Fábio Sirino)


Não há quem possa com o desejo
Mais que a consciência
Ele chega e traz a tona todo pecado
De almejar o proibido
Na máxima excitação imaginada.
*
Em tardes movimentadas no mercado
Eu quase perdido a procurar
E ali esperando os que buscam
Uma moça de pele clara
Eu que gosto do calor das caboclas
Via em seus olhos verdes
E no contorno de sua boca
Na forma do seu nariz
A cara da nossa mestiçagem...
*
O decote comportado de sua blusa
O charme do seu escarpim preto
E os gestos delicados
Eram filtrados e analisados
Em mim, mil olhares discretos
Como se meus olhos fossem além
Que o limite da física
E por entre suas roupas
Chegassem meus dedos e toques.
*
Ainda sinto o seu cheiro suave
E ela mal passou perto de mim
Mal nos tocamos, mas era apenas a primeira vez
E eu não deixaria de voltar para revê-la
Seria a partir de então
O maior admirador da arte nordestina
“Descobriria” uma alergia a todo e qualquer material
Que não fosse o coro das suas sandálias.
*
Voltava lá todos os meses
Tudo parecia mais próximo
Dos desejos que sonhava em minha cama
Seu sorriso, e até seus seios
Pareciam mais próximos da minha imaginação
Pouco a pouco descobria suas formas
E prováveis delícias,
Mas falta seu gosto e seu calor
Em tantas fantasias já vividas em monólogo
Assim vivia meu espetáculo.
*
Por quantas vezes a toquei mais fundo
E a vi morder os lábios já sem graça
Por arder em desejo e se conter em medo e vergonha
Talvez os seus lábios
Nunca sejam tocados por mim
Talvez sequer um beijo eu tenha dela
Mas meus sonhos e paixões
Por sua beleza única e seus mistérios
Ali no meio da feira ficaram com o resto de mim...
*
Até hoje ainda sonho com seus pecados
E suas confissões mais íntimas
Desfrutando da verdade que somos
Nas fantasias que negamo-nos
Deixando como resto o fascínio do nosso sexo
Murchar como rosa dos desejos.
(dição e colaboração de Camila Dantas)

28 de ago. de 2008

Noites de Ser Só (Fábio Sirino)


Ela não esta a fim de sair só

Solitária assim numa sexta

Em meio a tantos outros iguais

Que ela por esta só

Talvez não enxergue

A vontade que sentem

De estar perto dela

E não a culpo por isso

Por desencontrar seus olhares

Dos tantos outros que a buscam

Em espaços de carnaval

Pois ali tudo parece apenas brincadeira

E fugimos da presunção do óbvio

Encarnamos apenas o papel do esquecido

Vestindo a fantasia de cordeirinho

Ela se abandona e mesmo linda

Sufoca seu brilho em euforia

Às vezes nem sai de casa

Fica a frente de uma tela

Talvez buscando companhia

Talvez querendo acreditar

Que ali sua solidão fosse menor..

Mas ausência de calor aos seus desejos

Faz menções a mais uma noite triste

Ela bela e avassaladora

Apenas esconde o seu espelho

Num olhar entre a entrega e o pudor

Não menos fechada que um coração magoado

E não menos fácil que as desesperadas

Assim entre a cronologia que rege sua face

Na beleza de suas formas e gestos juvenis

Mal chegou a ser mulher

E tantos sentimentos a perturbam

Que filósofo ousa a descrever

A grandiosidade de suas dúvidas

Transição entre o medo e a descoberta

Assim tantas que ainda se enxergam menos

Encontram mais de si no olhar alheio

Enquanto as que se acham acabam se perdendo

Não que o mundo seja voraz

Ou não que ele não seja feroz

Aqui numa cidade subdividida

Entre o muito e o nada

As pessoas seguem suas riquezas

E desejam mais e mais

Porque que com ela seria diferente?

Ela sai e encontra os de sempre

Nem amigos nem desconhecidos

Os de sempre, com as mesmas falas

A atração até que é diferente

Mas os medos sempre são quase iguais

E assim cegam ela

Sozinha nas noites

Acreditando precisar de companhia...


26 de ago. de 2008

Um conto de bailarina. (Fábio Sirino)


Chega forte num suave amarelo
De sorriso largo, aberto demais
Lindo demais, fascinante demais...
-Duvido sempre do exagero-
A soberba da alegria
Sempre esconde um precipício de solidão
Ou um mar de tristeza.
Ela linda, vezes sagaz e vezes boba
A cada gesto suave de bailarina
Eu envolvia-me mais
Temia algo feito feitiço
Feito coisa que entorpeça.
Ela um misto de princesa e náufraga
Bailando entre medos e afirmações
Na ânsia de nem sei o que
Sem se incomodar com o salto
Das suas sandálias quase de cristal
E falo como se íntimo fosse
Mesmo longe das minúcias e mistérios
Cego ao destino que ali apresentava-se
Voltando ao meu pedaço de cidade
Com um pouco dela em minha poesia
Um pouco da irreverência delicada
A cortar pretendentes e enfeites
Ao evitar investidas e flertes
Dos fatos tidos como inoportunos
Ali na zoada do baque
No meio de muitos
Meus olhares a procuravam
Num pátio lotado de tantas outras almas
Talvez a mais problemática
Talvez a mais insegura e recolhida
Mas buscava assim sem nem pensar
Como se apenas fosse observar
Em ligações e interações
Faltou o bale
Mas sobrou o espetáculo
E se eu cantasse algo
Se eu declamasse algo
Ali diante dela seria irrelevante
Pois a sua luz enevoada
Era o contexto da Historia
Sem reis, heróis ou donzelas em perigo
Num espetáculo solo ela dançava
Numa dança urbana contemporânea
Improvisada, popular tradicional
Um estudo vivo do espetáculo de sermos.
Ali natural e bela
Vezes princesa e vezes boba...
Numa noite fria aonde tudo ia além
Que meros contos de fadas...

Para uma linda princesa que sabe dançar que mal conheço mas que muito tem a dizer em seus poucos anos de vida.



22 de ago. de 2008

Descartáveis... (Fábio Sirino)


Escrevo hoje a última poesia
Versos avulsos em correspondência digital
Assim construo amores pré-programados a um fim
Minha eternidade sentimental
Tem um tempo útil curto
Como assim invento amigos e comunidades
Talvez a tecnologia nos deixe solitários
Mas com a sensação contrária
De muitos contatos e muitos endereços
De muitas visitas e milhares de mentiras
A verdade é que dizemos acreditar
Em alguém que nem sabemos se realmente somos
Deixo circunstanciados contatos com amores mortos
Não busco endereço, recados ou lembranças
Não desejo o mau, não desejo bem
Já não me desperta interesse
Os dias ou as noites
Fico apenas com poesias e obrigações
A de trabalhar, a de fazer semanalmente minha faxina
A de me manter leal as minhas crenças
Obrigação para com meu filho
De resto... De resto nada mais que minha música
Nada mais que a descrença
Se os computadores nos impedissem de mentir
Polcas pessoas usariam suas fantasias
Como justificativas a falta de caráter
Mas quem em tempos de modernidade o tem?
Quem em tempo de apocalipse urbano
Tem algo feito a compaixão e pureza?
E ainda ouso adverti: - se encontrares alguém
Com olhar de anjo e corpo de diaba...
Não precisa correr ou abdicar do pecado
Prove dos sabores sem muitas repetições
Resuma-se a comer, sorrir e descartar a embalagem.

12 de ago. de 2008

Olhar Traidor (Fábio Sirino)


Vejo em tinta amarela
Minha faixa limite no meio da estrada
Vejo em tons vermelhos
Um molho que traz a minha massa sabor
Talvez como hoje mais que meu limite
Como se após vomitar
Esquecesse toda mentira que é você
Mas sei que seria impossível
Pois as tragédias marcam
Deixam cicatrizes
E pouco me importo com tua decepção
Com tua mágoa profunda
Na seca de verdade que seus dias acumulam
No egoísmo extremo que são olhos
Olhos famintos de sono
Já não tenho mais amor
Já não tenho mais amizade
E não pelo que se comenta
Mas sim pelo que se pensa
O erro maior é duvidar
Crer que poderia ser igual a você
Cruel ao enganar
Cruel ao ter do outro mais que a alma
Ter o dinheiro e a sanidade
Como se isso não bastasse
Tira o sorriso e pouco a pouco a vida
Como um vício atende a suas necessidades
Sejam os que você conquista
Ou os que lhe escolhem
Já não tenho paciência
Para dar explicações do que sempre fiz
Do que compartilhei
Quero silencio
Quero sua ausência
Ninguém mais que eu sabe de mim
Talvez Deus saiba um pouco
Mas o que sabe Deus do meu inferno
Nem satanás acredito que saiba
O que ele entende de inferno
Se ele não conheceu sua guerra santa
Nem seu Olhar Traidor.

6 de ago. de 2008

Aplausos! (Fábio Sirino)

O palco parece tão distante
Mesmo num teatro tão pequeno
Nossos lugares não nos permitem toques
As luzes nos impedem
As luzes me impedem
Tecidos, palhaços, saltos e pés
Fotos, flores anônimas e risos
Antes mesmo que vissem o autor
O sucesso era certo
Ali alguém maior que minhas explicações
Que minhas discrições poéticas
Uma nova força elegante
Com ar de dona do desejo
No foco central do senhor Deodoro
Ela a dançar e todos ali parados
Como se novidade fosse
Parar para vê-la passar ou dançar
Poucos risos, muito encanto
Mas de mim poemas e silencio
Paro nas flores
Talvez rosas
Algo mais covarde impossível
Perto da bailarina caio em contradição
Sou mais um na platéia
A observar seus mistérios
Impávido, invalido e surpreso
Vencido por seus movimentos
Esperando a projeção das imagens
Irem ao lustre e voltar à platéia
Numa esperança boba de ser visto
Talvez a foto dela toque meu rosto
E por isso sonhe
E por isso sonhe com ela
Dançando para mim
Sem acordar mais e sem fim
Pois nos espetáculos de dança
Não se pede bis.